Cafeicultor de saca vazia

Em artigo publicado no Estado de Minas, sob o apelativo e acertado título “S. O. S. para o café”, o vice-governador Alberto Pinto Coelho, afirmando que “a forte redução, em curtíssimo prazo, do preço da saca sugere gigantesca manipulação praticada pelos mercados compradores e consumidores”, com a lucidez que lhe é peculiar, ressaltou a importância da imediata adoção, pelo governo federal, das medidas propostas pelo governador de Minas, Antonio Anastasia: renegociação das dívidas do setor cafeeiro, com suspensão da cobrança de débito por 120 dias; e estímulo à comercialização de 10 milhões de sacas do café arábica, mediante acionamento, pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), de um de seus instrumentos de política agrícola, o Pepro (Prêmio Equalizador Pago ao Produtor Rural.
 
A situação vivida pelo setor cafeeiro, e descrita naquele artigo, lembra o conhecido cabo de guerra, em que equipes, em posições simetricamente opostas, puxam uma corda, tendo como objetivo fazer o adversário ultrapassar a linha central, escorregar ou cair. Numa das extremidades estão compradores e concorrentes que manipulam preço; e na extremidade Brasil, agricultores, cooperativas, municípios e estados, tendo, ao centro, um abismo onde o lado da produção pode sucumbir, um levando o outro num efeito dominó. Se não trouxer para a corda a força governo federal, puxando pelo Brasil, o destino será irremediavelmente aquele abismo. 
 
A corda está esticada e as forças do lado de cá — 287 mil produtores em todo o Brasil e cerca de 4 milhões de pessoas somente em Minas Gerais — extremamente fragilizadas. Não sustentarão a luta de plantar, cultivar, colher, armazenar e escoar mais de três bilhões de quilos de café, tendo que pagar por isso. É o que acontece quando o mercado pressiona o preço para valores próximos ou abaixo do custo. O desequilíbrio de preço é a provocação do adversário para ganhar palmos da corda do cabo de guerra. E como fica de pé o agricultor? E a sua família, que só tem o campo, o cafezal e a esperança de dias melhores para se escorar? 
 
Próximo da linha central, o setor cafeeiro não pode perder mais tempo. Já perdeu corda porque o governo federal demorou a estabelecer o preço mínimo e, quando o estabeleceu, o fez em valores inferiores aos necessários. A presidente Dilma precisa ter sensibilidade e ação. Desde abril, Antonio Anastasia — que tem ao seu lado o especialista e grande defensor do tema, secretário de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Elmiro Alves do Nascimento – dando acolhida ao movimento dos produtores rurais de mais de 600 municípios mineiros, e das entidades representativas, vinha defendendo a garantia de preço mínimo, o que somente veio a ocorrer em agosto. De lá para cá, a situação piorou e reclama as medidas emergenciais ora propostas pelo governo de Minas. O governo federal tem que botar logo a mão nessa corda e fazer valer o seu poder, até porque tem recursos disponíveis para isso, instrumentos adequados e razões suficientes para agir, inclusive os precedentes em relação à indústria automotiva, de material de construção e de produtos da linha branca. Não é hora mais de receio ou dúvida. Não é hora mais de protelações, que só podem acentuar a gravidade da situação. 
 
Dar, nesta hora, um puxão na corda do cabo de guerra, com os leilões para facilitar a comercialização de parte da safra e a recomposição das dívidas, significa dar novo fôlego ao setor, capaz de reverter os palmos perdidos. Mas isso é apenas o primeiro passo, o do soerguimento da cafeicultura. A Marcha do Café, que levou a Brasília semelhante pauta, remonta a 2009. Quatro anos depois, luta-se ainda contra a precarização do setor. 
 
O segundo passo é pensar o setor a longo prazo, com definição de políticas públicas que permitam o planejamento, a fixação de estratégias e metas empresariais por parte dos empreendedores e, assim, poder dar novos saltos e abrir novas frentes. O nosso café precisa estar na mesa dos chineses, assim como precisa elevar-se, com grandeza e determinação, à categoria de produto industrializado, deixando de ser apenas uma commodity, sujeita às manipulações de preço a que comumente são submetidos os produtos primários. 
 
Sem dúvida que os novos saltos do setor cafeeiro estão diretamente relacionados com a capacidade de industrialização e processamento do nosso produto. E isso depende de investimentos que, por sua vez, dependem do nível de poupança e capitalização dos empresários do setor. E isso somente será possível se a corda do cabo de guerra permanecer equilibrada por um tempo razoável de maturação, com o governo federal puxando, com os recursos e poder que tem, a ponta Brasil. O país encher-se de sacas e divisas tem como premissa lógica não continuar o agricultor de saca vazia.
Fonte: Jornal O Estado de Minas

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *